
Sobre o equívoco de afirmar que a sentença constitui um silogismo
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Vez ou outra me deparo, na internet, com professores de redação jurídica afirmando que a sentença apresenta forma de silogismo, em que se tem uma norma legal (premissa maior), o caso concreto (premissa menor) e a decisão em si (conclusão).
Ingenuidade.
Quem assim pensa pouco sabe sobre o processo de decisão judicial.
A noção de silogismo nasceu no século IV a.C., com ele, é, o cara, Aristóteles, que foi quem introduziu a lógica formal e a lógica dialética entre nós.
Calma que vou explicar.
A lógica que estuda as conclusões válidas, graças unicamente à forma, chama-se lógica formal.
Exemplo dela é o silogismo “se A é B e se B é C, então A é C”.
Vejam que não se analisa aqui o conteúdo das proposições.
A lógica na qual o conteúdo assume mais importância do que a forma chama-se lógica dialética.
O equívoco de afirmar que a sentença constitui um silogismo
Exemplo desse tipo de lógica é o silogismo “todos os jogadores de futebol recebem bom salário; ele é jogador de futebol, então ele recebe bom salário”, no qual podemos analisar a verdade ou a falsidade das proposições que o compõem (sabemos, por exemplo, que nem todos os jogadores recebem bom salário).
É com base na lógica dialética que muitos afirmam que a sentença judicial tem forma de silogismo (a divisão da sentença em relatório, fundamentos e decisão também leva a esse entendimento).
Ocorre que os que assim afirmam pararam no meio do caminho do estudo da teoria aristotélica (se é que algum dia chegaram a estudá-la), sem tomarem conhecimento do conceito de “entimema”, que, ao contrário do silogismo, é o raciocínio cuja conclusão não decorre de premissas explícitas.
Exemplo de entimema é a estrutura “ele é bondoso, então ele é religioso”, que tem implícita a premissa maior “todo bondoso é religioso”.
Nesse sentido, a sentença tem forma entimemática, não silogística.
Afirmar que a sentença constitui silogismo seria ignorar as idiossincrasias do juiz, as inúmeras possibilidades de interpretação do texto legal, ignorar aspectos ideológicos, sociológicos e econômicos da lide, enfim, ignorar os juízos de valor que permeiam o ato decisório, os quais, sabemos, nunca são explicitados em forma de premissas e não podem, assim, participar de silogismos.
Era isso.