
Recentemente, fui surpreendido por uma observação feita por minha filha após uma aula de produção textual. Ela afirmou que escrever “como, por exemplo,” constitui redundância, segundo a orientação de seu professor. A partir desse comentário, propus-me a refletir mais detidamente sobre essa construção linguística tão comum quanto polêmica — e que, à primeira vista, pode parecer equivocada, mas que merece análise mais profunda sob a ótica gramatical e estilística.
Pleonasmo: Vício ou Figura de Linguagem?
Pleonasmo é o nome técnico para a repetição de ideias por meio de palavras distintas que compartilham, total ou parcialmente, o mesmo sentido. Essa repetição pode ocorrer de forma viciosa — ou seja, indesejável do ponto de vista da clareza e da concisão do texto — ou pode constituir figura de linguagem legítima, com função expressiva e estilística.
O pleonasmo vicioso consiste em um excesso de palavras que não acrescenta significado e que compromete a objetividade da mensagem. Expressões como “subir para cima” ou “entrar para dentro” são exemplos clássicos desse tipo de construção, pois a informação adicional contida nos advérbios “para cima” e “para dentro” é desnecessária. A mensagem já está completa nos próprios verbos “subir” e “entrar”.
Por outro lado, o pleonasmo pode ser uma figura de sintaxe legítima, empregada para dar ênfase ou fluidez à frase, tornando o texto mais elegante e persuasivo. Trata-se do chamado pleonasmo estilístico, amplamente utilizado na literatura, na oratória e na escrita técnica quando o objetivo é fortalecer ou ilustrar determinado argumento.
A Construção “Como, por exemplo”
Retornando à construção “como, por exemplo”, é inegável que ambos os elementos introduzem uma explicação ou exemplificação. Tecnicamente, trata-se sim de um pleonasmo — afinal, “como” já tem a função de introduzir exemplos, assim como “por exemplo”. A dúvida reside em saber se tal repetição é um vício gramatical ou se pode ser admitida como recurso estilístico.
A gramática normativa mais conservadora, a exemplo de Bechara (2009) e Cunha & Cintra (2013), tende a desaprovar essa repetição. No entanto, o uso consolidado em textos jornalísticos, jurídicos e acadêmicos demonstra que, quando bem empregado, o pleonasmo pode contribuir para a clareza e ênfase da informação transmitida. O acréscimo de “por exemplo” após o “como” pode não apenas evitar mal-entendidos como também suavizar a leitura, tornando o exemplo mais perceptível ao leitor.
Considere a seguinte frase:
“O habeas corpus não serve de substitutivo de recursos, como o de agravo em execução penal.”
Embora tecnicamente correta, essa frase pode parecer abrupta ou até mesmo ambígua à leitura desatenta. Agora observe a mesma frase com o uso do pleonasmo estilístico:
“O habeas corpus não serve de substitutivo de recursos, como, por exemplo, o de agravo em execução penal.”
Percebe-se que a segunda formulação é mais fluida e clara. A inserção de “por exemplo” orienta o leitor sobre a função da segunda parte da frase — não como informação adicional ou circunstancial, mas como um exemplo ilustrativo do argumento central. Nesse caso, o pleonasmo cumpre papel comunicativo e estilístico relevante.
Considerações Finais
A crítica ao uso da expressão “como, por exemplo” parte de uma lógica gramatical rígida, que considera redundante a repetição de ideias. No entanto, a linguagem não é composta apenas de normas fixas; é também um instrumento de comunicação e persuasão. Se o uso de determinadas construções melhora a fluidez, amplia a clareza e contribui para a força argumentativa do texto, é legítimo empregá-las, mesmo que sob a forma de pleonasmo.
Assim, a expressão “como, por exemplo” não deve ser automaticamente condenada como erro. Ao contrário, pode — e deve — ser utilizada com consciência estilística, sobretudo quando contribui para uma melhor compreensão do texto e fortalece a argumentação do autor. A chave está no equilíbrio entre norma gramatical e eficácia comunicativa. Escrever bem é, em última análise, saber escolher, entre formas possíveis, aquela que melhor cumpre o propósito do texto: convencer, informar ou emocionar.
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