
É comum acreditar que, ao serem os autos finalmente conclusos para sentença ou julgamento, o magistrado seguirá uma ordem lógica e cronológica de leitura: petição inicial, contestação, réplica, razões recursais, contrarrazões, e assim por diante. Muitos imaginam, por exemplo, que em uma apelação o juiz ou relator lerá antes de tudo as razões recursais. Mas será mesmo que a prática forense funciona assim?
A realidade, ao menos a partir da experiência de quem atua diretamente nos bastidores da magistratura, é bem diferente.
A lógica real da leitura judicial
Com quase uma década de atuação como assessor de desembargador, posso afirmar que a peça que o magistrado lê primeiro, e com atenção verdadeira, é aquela que mais o ajuda a compreender o processo. Não há rigidez cronológica, nem apego formal à sequência processual. Há, sim, uma busca pragmática por compreensão e eficiência.
O juiz — ou seu assessor, em um primeiro momento — se detém na peça que mais ensina sobre a causa, que melhor expõe os fatos relevantes, que traz fundamentos jurídicos mais claros ou que antecipa com lucidez os pontos decisivos da controvérsia. É essa peça que, na prática, será a primeira a ser lida de cabo a rabo.
Quem costuma ter sua peça lida primeiro?
Pelo que tenho observado ao longo dos anos, há uma tendência: quando um dos polos da demanda é ocupado por ente federativo, Ministério Público ou Defensoria Pública, costuma-se ler primeiramente a peça desses órgãos. O motivo? Uma presunção — justificada ou não — de que tais peças foram redigidas com maior rigor técnico e informativo. A ideia é simples: começar por onde se imagina que a compreensão será facilitada.
Essa prática não é uma regra escrita, tampouco é absoluta. Mas é uma realidade costumeira na rotina dos gabinetes. Em demandas complexas, especialmente, o juiz buscará primeiro a peça que lhe proporcione luz sobre os fatos e sobre o direito aplicável, ainda que não seja a primeira peça nos autos.
A peça que se basta
Por isso, um conselho de ouro a todos os advogados e advogadas: sua peça deve ser autossuficiente. Redija como se ela fosse a única fonte de informação do juiz. Ela deve conter, com clareza, concisão e completude, tudo aquilo que é necessário para a compreensão da lide.
Jamais presuma que o julgador terá tempo ou disposição para “ligar os pontos” entre sua contestação e a petição inicial, ou entre suas contrarrazões e o recurso adverso. Seu texto deve funcionar sozinho, de forma coesa, como se não houvesse outra peça no processo. Quanto mais clara, objetiva e tecnicamente robusta for sua argumentação, maior a chance de ela ser lida primeiro — e com maior atenção.
Assista aos meus vídeos no Youtube
Me siga no Instagram
Compre o E-book Guia de Redação Jurídica