
Um dos traços mais importantes de um advogado tecnicamente refinado é sua capacidade de antecipar os movimentos da parte adversa. Essa habilidade — que, em última análise, é aplicação prática da teoria dos jogos no processo — exige percepção estratégica, clareza de objetivos e, principalmente, senso de oportunidade.
Nesse contexto, há uma regra prática que todo advogado deve seguir: se há um fato que inevitavelmente virá à tona e desfavorece o cliente, o melhor a fazer é revelá-lo proativamente — desde que tal revelação seja juridicamente necessária ou processualmente relevante.
O que não se pode admitir, em hipótese alguma, é que o juiz tome ciência de um dado desfavorável somente pela manifestação da parte contrária. Essa omissão tende a ser percebida como tentativa de omitir a verdade, e mina a credibilidade da parte perante o juízo. Piora a percepção do julgador e, consequentemente, enfraquece todos os argumentos que a parte queira sustentar depois disso.
Mas atenção: antecipe com propósito, não por paranoia
Se por um lado é essencial antecipar teses que certamente serão levantadas pela parte adversa, por outro, apresentar argumentos sobre questões que sequer estão em debate pode ser prejudicial.
Recentemente, me deparei com uma petição inicial em que o advogado, antes mesmo de narrar os fatos, dedicou dez páginas à defesa da competência territorial do juízo. Não havia contestação prévia, nem elementos no caso que sugerissem risco de declínio. Ainda assim, o tema foi longamente desenvolvido — sem provocação alguma.
A consequência desse tipo de abordagem? O juiz que lê aquela petição naturalmente desconfia: “Se o advogado está tentando tanto convencer sobre a competência, talvez haja, de fato, algo errado.” E então, o juiz envia a peça para o assessor com um recado: “Verifique com atenção se somos mesmo competentes.”
Resultado? Risco de declínio indevido da competência, suscitação de conflito, paralisação do processo, envio ao tribunal, e um cliente que aguarda a resposta do Judiciário como se estivesse sentado numa sala de espera interminável.
O uso estratégico do silêncio
Não se trata de esconder ou manipular. Trata-se de ser inteligente na forma de apresentar sua tese. Se não há risco real de impugnação e se a matéria não é de ordem pública, evite levantar questões que só provocarão ruído. Lembre-se de que o processo é comunicação — e toda comunicação deve ser pensada em termos de impacto e clareza.
Claro: se houver controvérsia conhecida sobre determinado ponto — e.g., competência, legitimidade, prescrição —, é imprescindível abordar o tema com profundidade e técnica. Mas esse cuidado não pode se transformar em excesso. O advogado precisa distinguir o que deve ser enfrentado do que pode ser silenciosamente superado.
Conclusão
Advogar bem não é apenas conhecer o direito — é, sobretudo, saber quando, como e por que aplicar cada argumento. A técnica exige que você antecipe a jogada, mas a estratégia exige que você não marque gol contra. Nem tudo que pode ser dito deve ser dito. E nem tudo que pode ser alegado merece destaque na petição.
Aprenda a usar o silêncio como ferramenta — e a argumentação como espada, não como buzina.
Se quiser, posso adaptar esse texto para carrossel ou roteiro de vídeo. Deseja isso?
Assista aos meus vídeos no Youtube
Me siga no Instagram
Compre o E-book Guia de Redação Jurídica